A vida deve continuar | A Ilha secreta Pular para o conteΓΊdo principal
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A vida deve continuar

Metaforicamente Coisas da vida 0
VocΓͺ sabe, nunca fui boa em refletir nos dizeres aquilo que sinto dentro de mim. Sou um tanto desajeitada e intensa, atropelo as pontuaçáes e por vezes meu sujeito nΓ£o conjuga os verbos no tempo da ação.

Aquele dia, porΓ©m, por trΓ‘s daquela camada de alegria havia uma inseguranΓ§a retida no seu olhar. Gelei. Meu ego estava tΓ£o acondicionado a ser sempre o ferido que busca conforto em seu colo. Ver-te vulnerΓ‘vel me desestabilizou por completo. A sua luta nΓ£o podia ser enfrentada por ninguΓ©m mais a nΓ£o ser vocΓͺ mesma.

Entretanto, fui para o campo de batalha enfrentar o inimigo assim como vocΓͺ fez tantas outras vezes por mim sem sequer cogitar o contrΓ‘rio. E pela primeira vez eu saΓ­ da minha cΓ‘psula de protegida para tentar fazer algo por ti.

Não sabia exatamente o que poderia fazer ou por onde começar, só queria de alguma forma que soubesse que foi contigo que aprendi conceitos que dicionÑrios jamais poderiam ilustrar e que eu faria o impossível para retribuir toda devoção e carinho que teve comigo, embora o que eu fizesse jamais se compararia a grandeza das suas atitudes.

Segurei suas mΓ£os entre as minhas, olhei seus olhos baixos e com convicção disse que te amava. Sem delongas ou outros adjetivos que pudessem florir a fala mesmo que o sentimento mais puro e lindo estivesse ali no peito. Disse assim, cruamente. VocΓͺ assentiu humildemente tendo plena certeza que minha mensagem extravasava os limites silΓ‘bicos. E eu entendi que por mais fraca que vocΓͺ estivesse jamais deixaria de me proteger.

Ah, minha querida se eu soubesse que aquele nosso abraΓ§o seria o ΓΊltimo, nΓ£o teria te deixado nunca... Congelaria o tempo nos nossos momentos mais felizes. E sΓ£o diversos que sequer dou conta de discernir o superlativo. Ainda na doenΓ§a ou tristeza, jamais deu vez para o pior se instalar. Com maestria e um sorriso no rosto vocΓͺ conduziu a situação. Aqui consigo te destacar como meu maior exemplo de superação. Por mais que eu tentasse seguir seus passos, era nΓ­tido que eu nunca poderia ser como vocΓͺ. TΓ£o forte, corajosa, brava e, simultaneamente, o sinΓ΄nimo de amor, doΓ§ura e carinho.

Eu procuro forΓ§as nos ensinamentos que me deste. Tento encarar o futuro de cabeΓ§a erguida, mas sΓ³ de imaginar que vocΓͺ nΓ£o estΓ‘ nele um medo me assola. Γ‰ como naquelas noites de trovoadas em que eu me refugiava em sua cama. SΓ³ que vocΓͺ nΓ£o estΓ‘ lΓ‘ mais pra me aquecer. Γ‰ como aquele nervosismo no estΓ΄mago antes de subir ao palco e procurar seu olhar na platΓ©ia para me tranquilizar. SΓ³ que ao redor nΓ£o vejo semblantes como os seus. Ou aquela paz de apΓ³s um dia horrΓ­vel chegar em casa e ter aquela sensação de que ao seu lado, nada pode me abalar. Mas vocΓͺ nΓ£o estΓ‘ em casa.

Eu percorro os cΓ΄modos, toco em seus objetos, sinto seu cheiro... mas nΓ£o sinto a sua presenΓ§a. Nada alΓ©m dessa sensação de abandono e vazio, de que hΓ‘ um abismo gigantesco que me impossibilita de te encontrar. Γ‰ horrΓ­vel sentir outras mΓ£os me segurando e nΓ£o sentir mais o seu toque. Γ‰ difΓ­cil dormir sabendo que nunca mais vou acordar com vocΓͺ chamando meu nome. PΓ©ssimo ainda Γ© acordar e ter que lidar com o fato de que isso tudo nΓ£o Γ© apenas um pesadelo.

Γ‰ irΓ΄nico porque vocΓͺ dizia que agora eu jΓ‘ sou crescida. Mas sinto que ainda sou aquela crianΓ§a que durante suas viagens te ligava a todo o momento perguntando se jΓ‘ estava prestes a voltar mesmo sabendo que a resposta seria negativa. Sinto aquele desespero me tirando o ar e sequer posso usar o consolo de que dentro de mais alguns dias te verei novamente. Dessa vez foi uma viagem sem volta e nos despedimos com um “atΓ© breve”.

Reviro minhas memΓ³rias buscando um momento de fΓΊria que tivemos para tentar amenizar essa dor. Mas atΓ© nossos desentendimentos se transformavam em piadas posteriormente. Sua expressΓ£o debochada remedando meu mau humor e sua risada contagiante sobressaem qualquer pensamento ruim que eu tente imaginar sobre vocΓͺ.

Meu coração fica minúsculo quando começo a desdenhar desfechos diferentes deste. E por mais que eu saiba que fiz tudo que minha capacidade permitiu, ainda, sim, uma sombra de dúvida paira em meus raciocínios. Se eu tivesse a chance de me desculpar contigo por não ter te obedecido, pelas vezes que menti, por não ter demonstrado mais todo esse amor e admiração que sinto...

O que não cabe em mim é a saudade. Ela é imensa e meu corpo jÑ não a sustenta mais. Os momentos que tivemos foram ímpares. Se eu pudesse reviver cada lembrança, não alteraria nada. Deixaria intacto e conservaria em Òmbar. Sempre, para todo e eterno sempre, vou ser grata por ter me amado incondicionalmente, por ter acreditado em mim quando nem eu o fiz, por ter sentido orgulho das coisas que fiz e da pessoa que me tornei. E mesmo sabendo que nunca serei nem um terço do que foste me sinto honrada quando evidenciam nossas semelhanças.

Diversas vezes vocΓͺ me preparou para sua partida, entretanto Γ© inevitΓ‘vel nΓ£o sentir essa inconformidade, essa angΓΊstia ao ver outras pessoas se apoderando do que era tΓ£o seu, de ter que ouvir semΓ’nticas que sei que jamais disseste, mas insistem em atribuir a vocΓͺ.

A vida deve continuar. De alguma forma. Estou tentando me fazer forte como vocΓͺ para reinventar a minha rotina sem o seu aconchego, seu carinho e seus conselhos. Estou tentando deixar essa dor ir embora para que quando eu pensar em vocΓͺ nenhuma lΓ‘grima de tristeza caia, para que eu sinta somente aquela sensação de que sou feliz e abenΓ§oada por ter te conhecido.

NΓ£o ouso me despedir, assim como vocΓͺ nΓ£o fez da ΓΊltima vez que nos encontramos. Despedidas nΓ£o fazem nosso tipo, principalmente quando existe essa conexΓ£o que hΓ‘ entre a gente. Vou te amar para sempre!